sábado, 30 de abril de 2011

O Caminho das Pedras [1]

Disseram que eu deveria aproveitar este espaço para falar da minha experiência como escritor, especialmente para aqueles que se interessam em dar os primeiros passos nessa aventura, mas ficam inseguros. Faz sentido. Não existe nenhum mapa da mina, mas posso pelo menos falar da minha experiência, admitindo que ela está efetivamente me levando a algum lugar. Como diz um amigo, chover ainda não faço, mas já estou fazendo trovejar.

Passei a vida toda, desde criança, quando as professoras liam minhas redações nas outras classes, ouvindo dizer que eu escrevia bem, e que deveria investir nisso. Mas professor, amigo e familiar é tudo gente suspeita para falar, então eu não me sentia absolutamente seguro, embora tivesse muita vontade de escrever cada vez mais e melhor. Um dia comecei a ler algumas coisas, e a achar que eu era capaz de escrever de forma pelo menos semelhante à daqueles caras. Caras publicados! Foi o que finalmente me levou a pensar, com toda segurança, que eu merecia ser publicado também.

Mas o pontapé inicial aconteceu quando as coisas começaram a desmoronar. Eu morava sozinho, e tinha um colchão confortável, uma geladeira, TV com videocassete e um computador. Vários campos da minha vida começaram a desmoronar de uma vez só, e a perspectiva de voltar sozinho para minha casa e ter que me defrontar comigo mesmo era aterrorizante. Eu sabia que a convulsão dos pensamentos me tiraria o sono todos os dias. Foi quando percebi que, para não ficar doido, eu precisava ocupar minha mente. E a maneira mais eficaz e prazeirosa de fazer isso seria escrevendo um livro.

Entre janeiro de 2000 e janeiro de 2001 nasceu Quintessência, meu primeiro romance, que surgiu de uma inquietude: as pessoas que agem corretamente e fazem o bem, até que ponto o fazem por convicção moral, e até que ponto o fazem por simples medo de serem apanhadas e sofrerem as sanções que suas atitudes más acarretariam? Então foi isso, o livro inteiro foi escrito para Samsara, meu gênio do crime do século XXI, e meu protagonista Tom Rizzatti nasceu como seu nêmesis, embora na história seja ele o protagonista. E esta é a primeira vez que conto isso.

Livro pronto, olho para a tela do computador, e me dá um frio na barriga: OK, e agora? Meu livro era um romance policial de ficção científica, e então lembro-me de uma saudosa publicação em paperback, já cancelada, a revista "Isaac Asimov Magazine", da qual sou um dos viúvos confessos. Nela eu costumava ver anúncios de um tal "Clube de Leitores de Ficção Científica". Decidi que era ali que eu ia buscar ajuda. Achei o site do Clube no Google, e mandei um e-mail que dizia que eu acabava de escrever um livro de FC, que eu queria me associar ao Clube e que precisava de orientações, pelo amor de Deus, sobre o que fazer com meu calhamaço.

Recebi uma resposta gentilíssima do então presidente do Clube, um tal Gerson Lodi-Ribeiro, que me explicou que eu não precisava me associar coisa nenhuma, sendo mais interessante para minha pessoa, que morava em BH, ou seja, longe do eixo Rio-Sampa, onde se desenvolviam as eventuais atividades do Clube, acompanhar as discussões dos associados em uma lista na internet. Também me deu uma série de dicas vitais sobre o que fazer com meu primogênito literário, como o registro na Biblioteca Nacional, procurar editoras que tivessem o perfil de minha obra, etc. Nesse intervalo eu havia recebido outros conselhos do escritor Mário Prata, cujo e-mail pessoal consegui junto a uma amiga em comum, e do escritor André Vianco, que havia vindo a BH lançar seu livro O Senhor da Chuva. Reparem que, na lista de agradecimentos do Quintessência, essas três ilustres pessoas são devidamente mencionadas.

Ajeitadas essas formalidades, começou a correria em busca de publicação, e aos poucos fui caindo na real. O mercado editorial de FC não era nada promissor, e cada vez mais eu me convencia de que BH ficava em Andrômeda, outra galáxia, longe demais de onde as coisas aconteciam de verdade. Cheguei a conseguir uma carta de crédito pela Lei de Incentivo à Cultura, e fiquei animado por necessitar de um valor absolutamente irrisório diante de outros projetos, que dançavam descontraidamente na casa dos três dígitos mais três zeros depois do pontinho. Nova decepção. Descobri que, além do jogo que me parecia ser de cartas previamente marcadas, as empresas querem muito ver seu nome associado à cultura, mas não estão nada a fim de dar dinheiro para a cultura. E que uma multinacional prefere, obviamente, investir milhões de reais em um filme de cinema, onde seu nome vai ser visto na tela por centenas de pessoas, do que bancar um livro de um joão-ninguém que nem vai saber o que fazer com o encalhe.

O lado bom foi que, na busca por patrocínio, conheci muita gente boa do ramo editorial e das gráficas. E foram estes que procurei, passada a frustração, decidido a bancar eu mesmo o meu sonho. Contratei uma editora e banquei, do próprio bolso, uma publicação de 1.500 exemplares do Quintessência. Vejam: eu tinha o dinheiro e confiava na qualidade do meu produto. Por isso não pestanejei, e hoje digo que não me arrependi jamais.

O livro vendeu 107 exemplares na noite de lançamento, o que para livro de ficção é uma boa marca. Me garantiu a amizade eterna (até hoje, pelo menos) do livreiro, e a exposição de meu livro na vitrine e nas ilhas centrais da livraria Leitura do BH Shopping por várias semanas. Fiz lançamento em bienal, e fui a programa de TV. Saiu resenha elogiosa no Estado de Minas.

Meu currículo me parecia bom o suficiente para me aventurar ao próximo passo: deixar Andrômeda, cruzar o abismo entre as galáxias, indo onde nenhum mineiro metido a escritor de FC jamais esteve. Mas isso é no próximo episódio.

sábado, 23 de abril de 2011

Animação Pra Levar a Sério

Hoje fomos, eu e a Lu, assistir a animação "Rio" (em 3D). Curioso como não havia nenhuma criança na sessão. Nem sequer um adolescente. Prova de que filmes de animação deixaram mesmo de ser exclusividade do público infantil. Na verdade, me encanta essa capacidade dos realizadores de animações no sentido de realizarem um mesmo filme que atenda a diversas faixas etárias, e diversas camadas culturais. Mostra que, para que a animação seja (como hoje já é) definitivamente levada a sério, isso tem que partir de seus realizadores. "Rio" é um excelente exemplo disso. Uma animação de primeiríssima qualidade. Bem feito. Respeitoso. Emocionante. Engraçadíssimo. Recomendadézimo.
Não é de hoje que os realizadores de animação, especialmente na dobradinha Disney/Pixar, investem pesado em algo essencial em qualquer produto cultural que se preze: pesquisa! Se você for assisti os extras contidos no DVD de "Up, Altas Aventuras" (por que brasileiro ainda tem essa mania de colocar subtítulo em filme?...), que concorreu ao Oscar de melhor filme, não perca o making of onde eles revelam o assombroso trabalho de pesquisa que fizeram em torno da ambientação, com expedições elaboradíssimas às mesetas de pedra em plena Amazônia venezuelana. No caso de "Rio" não é diferente, e não creio que nisso se deva apenas ao fato de ter um diretor brasileiro. A seriedade no respeito à inteligência do espectador parece já ter se incorporado na filosofia dos realizadores de animação para o cinema. Após me traumatizar, ainda jovem, ao assistir a animação "Alô Amigos"(1943), clássico da Disney que introduz o personagem Zé Carioca, e onde o Brasil é retratado como uma espécie de monstro híbrido entre a Bahia e o México; após me encolerizar durante o filme "Annie"(1982), quando uma personagem canta "Vocês já conhecem Buenos Aires..." enquanto desce ao fundo um painel pintado com a Baía da Guanabara; após quase infartar assistindo "007 Moonraker" ("O Foguete da Morte", olha outra pérola de tradução aí...), de 1979, onde James Bond foge de lancha pelo Rio Amazonas até despencar nas Cataratas do Iguaçu, além de brincar de gato e rato com o terrível Jaws no carnaval carioca... de rua... com outdoors em inglês... cheio de pessoas vestindo aqueles bonecos gigantes de Olinda... aaaaarrrrggghhhhhhhhh...(desculpem o desabafo)... bem, depois de todo esse sofrimento ao longo dos anos, foi com um prazer indescritível que vi, em "Rio", uma caracterização tão honesta do Rio de Janeiro para americano (e quem quiser) ver. OK, não sejamos mal-humorados. Eu sei que a Mata Atlântica restante em torno do Rio não tem mais, se é que um dia já teve, aquela exuberância em termos de fauna. Também sei que o Rio, como já disse, nem tem todo aquele carnaval de rua que o filme mostra. Mas convenhamos, essas pequenas "licenças poéticas" são perfeitamente adequadas dentro da trama, assim cmo o fato de a espécie das araras azuis ter sido reduzida a um único casal de espécimes antes da total extinção. Vejamos pelo lado positivo: a caracterização da cidade, como suas ruas, seus arredores e principalmente suas praia, é de uma exatidão mais do que satisfatória. A caracterização da favela é mais do que honesta. O desfile no Sambódromo é deliciosamente emocionante, com samba enredo e tudo. E a forma como o filme brinca com a paixão do brasileiro por futebol é uma das coisas mais deliciosas que tenho visto ultimamente na tela grande. Em resumo: vejam "Rio". Não é brincadeira de criança não.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

As Múltiplas Faces do Leitor

Perguntam-me, e sei lá que pensamentos obscuros conspiram nas coxias dessas mentes inquisidoras, se vou postar resenhas literárias neste blog. Mesmo porque, devo resenhas de livros que prometi. A resposta é "sim, com ressalvas".
Fato é que não me sinto à vontade em me denominar resenhista. Não, não o sou. Tenho comigo que para assumir esse título e todas as responsabilidades inerentes a ele (coisa que muita gente, infelizmente, não faz...) é preciso ter alguns talentos que não considero meus. Por exemplo, cito o distanciamento entre obra e autor, principalmente se o autor é conhecido seu, e também os conhecimentos técnicos necessários por trás do ato de escrever. Tenho tudo isso sim, mas em um grau que considero insuficiente para resenhar com responsabilidade. Também observo que, assim como acontece com os filmes, o julgamento que faço é frequentemente influenciado pelo humor do dia, ou da época. No meu caso, flutua com os resultados do futebol, com a cotação do dólar ou com o máximo denominador comum entre meus sucessos ou fracassos no dia-a-dia da selva. E penso que uma resenha honesta deva ter embutido um grau respeitável de isenção e atemporalidade.
Como leitor, me vejo em camadas. Primeiro sou o leitor comum, sem dar a esse termo uma conotação qualitativa, e sim quantitativa. Leio por prazer, por esse comichão incontrolável que me carcome desde que, ainda muito criança, não esperei que me alfabetizassem para ler em voz alta a frase "Posto Piazza" na parede do posto de gasolina, ato milagroso que causou furor nas testemunhas, que devem ter achado estarem na presença de um futuro gênio ou messias, e passados tantos anos, diante dos resultados, nem quero imaginar o que estarão pensando agora sobre a pegadinha. Leio porque respiro, porque não tenho outra alternativa, e não sou capaz de me ver não lendo.
Na segunda camada, leio como escritor, realidade que se descortinou na medida em que comecei não apenas a escrever, mas também a estudar o escrever. Assim, enquanto degusto a trama, observo estilos de narrativa, de criação de personagens, o uso de clichês e de metáforas, etc. Procuro aprender com isso, e usar o que aprendi a meu modo, de acordo com minha conveniência, em meu próprio ato de escrever.
Terceiro, depois que cruzei a galáxia e comecei a fazer amigos escritores, leio como quem observa os filhos dos amigos, e fica pensando de quem esse guri puxou essa mania, quem o ensinou a fazer essa gracinha, e por que não lhe deram uns cascudos para que não fizesse essa birra horrorosa. Porque a obra lhe diz muito sobre o autor, queira ele ou não. Ler o autor através do livro é mais divertido do que ler as linhas da mão, coisa que aprendi única e exclusivamente com o propósito de pegar meninas. Mas isso é outra história.
Portanto, não me considero resenhista, mas vocês deverão encontrar aqui, caso interesse, uma ou outra resenha minha. Por favor, encarem a coisa como se estivéssemos sentados numa mesa de bar, diante do caneco e do prato de tiragosto, e eu estivesse contando de algo que li, e que gostei. Ou não. Saúde.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

And here we go again...

Sim, eu já tive um blog. Nos primórdios dessa coisa, uma amiga e fiel escudeira para assuntos virtuais criou para mim o "Quintessência", com o objetivo de divulgar meu romance homônimo, então recém-publicado. Criou vários templates, que eu ia mudando como quem experimenta roupa em loja, e acabei optando por um escuro, sombrio, que remetia à capa do livro. Com o tempo me cansei daquele visual, que eu passei a achar muito pesado, e minha "fiel escudeira" não estava mais disponível (deve ter se cansado de minha obtusidade virtual, e foi atacar outros moinhos).
Conversando com os meninos da editora Estronho sobre minha vontade de voltar a ter um blog, eles me deram a maior força, dizendo que criar blog hoje é autoexplicativo, até um chimpanzé treinado consegue. Achei que com esse (o chimpanzé) eu era capaz de competir nesse assunto, então entrei no blogspot a fim de criar um novo blog, mais claro e agradável, mais de acordo com a atual cor da minha aura.
Deparei com um novo problema: o nome "Quintessência" não estava disponível. Claro que não, provavelmente é meu mesmo, o blog antigo, que jamais foi deletado (deleta-se blog da virtualidade?...), e está por aí, boiando em mares virtuais dentro de uma garrafa fosca com aquele template monstruoso, só para me atrapalhar. Se quiser vá olhar, não tou nem aí.
Mas eu insisti no nome, porque queria que no blog ele tivesse o mesmo sentido que o título tinha no livro. Neste, meu protagonista Tom Rizzatti (sim, "T"s e "Z"s duplos, se você leu vai sacar porquê...) se esforça para mergulhar na essência básica das coisas, sobretudo de grandes temas como Vida X Morte, Bem X Mal, o Ser Humano, etc, enquanto se desdobra para solucionar um caso de terrorismo internacional que respinga em Belo Horizonte.
Neste blog vamos tratar disso, da essência das coisas: da vida, das pessoas, dos acontecimentos, dos livros, do papel do bidê na arquitetura moderna dos banheiros. Porque abobrinha, mes amis, também tem essência. Lembrando que essência, às vezes, pode ser bem pessoal. Vamos ver no que dá.
Ah, como solucionei o problema: descobri que posso usar hífen no endereço eletrônico. Por isso o blog virou "A Quintessência", e no endereço tem um hífen entre o "A" e o palavrão. Taí. Conto com vocês. E vamo que vamo. Pronto, falei.