terça-feira, 18 de agosto de 2015

E AÍ, RECONHECEU?...

         




         E aí, reconheceu o cara? É, esse de camiseta branca, agachado, no canto direito da foto! Eu te digo quem ele é. Ou era...
     Ele trabalhava numa montadora de automóveis. Foi pego de surpresa na onda gigantesca, o tsunami de demissões que varreu o país na medida em que a crise (lembra da “marolinha”?...) explodiu. Poupança ele quase não tinha, e as migalhas que restavam a inflação comeu. Acabou o dinheiro, e não teve como pagar as prestações da casinha própria que ele comprava com tanto esforço e sacrifício. O carro e a geladeira, adquiridos em prestações a perder de vista, também lhe foram tomados, junto com sua dignidade.
     Sua esposa era diabética. Um dia, não encontrou a insulina de que precisava no posto de saúde. “Estava em falta”, lhe disseram, e o privilégio não era dela não, era no país todo. Como ele, demitido, perdeu o plano de saúde, no dia em que ela passou mal teve de recorrer a um posto do SUS. Foi atendida por um cubano, que lhe disseram que era médico, e que lhe prescreveu uma dose absurda de insulina, que ela comprou na farmácia com seus últimos trocados. A esposa morreu.
     Os dois filhos, com os cortes e atrasos no dinheiro do crédito educativo, tiveram de largar a escola. Não que perdessem grande coisa, já que o governo dessa Pátria Educadora cortou bilhões do orçamento para a educação, piorando a situação das escolas já sucateadas, ocupadas por professores mal preparados e pior remunerados. Os meninos estão em algum lugar por aí nas ruas, como ele, nas ruas deste país que – lhe disseram certa vez – “erradicou a miséria”.

     Nesta foto, ele está agradecendo às pessoas de amarelo. Ele sabe que elas saíram de suas casas aos milhares, sem ganhar por isso nem um churrasquinho, nem mesmo um pão com mortadela, para protestar por um país melhor, mais digno, para todos, inclusive para ele. Ele dá valor a esse ato, porque sabe que nem todo mundo é capaz disso. Tem aquelas pessoas que um dia votaram no partido que era “pelos pobres” e que hoje ocupa o governo federal. Ele sabe que aquelas pessoas se recusam a participar desse “golpe” das manifestações, como dizem, mas que não dispensam seu choppinho na balada dos finais de semana, enquanto ele está ali, sem ter o que comer. Por dentro, entretanto – ele pensa – sofrem de uma miséria moral tão grande quanto a que ele ostenta do lado de fora. Ou será maior? Que tragédia! Ele tem pena dessa gente, o cara de branco...