Uma discussão acerca do
racismo na obra de Monteiro Lobato e sua adequação para o uso em escolas
infantis, ocorrido recentemente numa comunidade do Facebook, com direito a
trombetadas, xiliquitos nas coxias, ranger de dentes e ataques apopléticos,
entremeados por argumentações mais ponderadas (e outras nem tanto) como pano de
fundo, motivam uma reflexão mais profunda sobre o tema, agora em ambiente
sereno, familiar e controlado, sem “estática” ou truculência desnecessárias,
como merece qualquer reflexão séria.
Qualquer assunto pode ser mais bem compreendido
quanto mais próximo conseguimos chegar de sua origem. Cabe aqui perguntar: qual
a origem do racismo? Qual o sentido (se é que existe, para o bem ou para o mal)
de sua existência?
Iniciemos esta longa viagem com uma
afirmação categórica: tudo aquilo que existe, e que não é parte da natureza,
nasce da mente do homem. A cadeira, sofá ou o piso onde você está sentado, o
teto sob o qual você se encontra, tudo isso um dia foi uma ideia, um
pensamento, na mente de alguém. A energia elétrica que alimenta seu computador,
essa energia domada que aquece e ilumina sua casa e suas ruas, vem da mente de
um homem que decodificou o conhecimento da força contida na natureza,
elaborando formas de usá-la para conforto próprio. A roupa que você veste, pois
dificilmente estará lendo estas linhas pelado, vem da mente de um homem que, lá
na pré-história, viu-se na necessidade de criar meios de se proteger da oscilação
do clima, evoluiu com a humanidade a partir da noção, surgida na mente, do
pudor, e acabou se esparramando em ciclos de estética e, diriam alguns,
frivolidade, quando a mente de alguém concebeu a moda. Portanto, a menos que
você defenda a ideia estapafúrdia de que o racismo é um processo natural, ele
provém da mente. Nesse caso, com qual finalidade (consciente ou não)?
O racismo nada mais é do que uma das
infinitas formas inventadas pelo ser humano para atender a um impulso
instintivo, que o acompanha desde os albores da espécie até, lamento o
pessimismo, seus últimos dias na Terra: a ânsia de dominar, de submeter seu
semelhante.
Antes dele, porém, é necessário falar de
outro costumezinho feio inventado pela humanidade: a escravidão.
O Código de Hamurabi, conjunto de leis
escritas da civilização babilônica, já apresentava itens regulamentando a
relação entre os escravos e seus senhores. No princípio, a obtenção de seres
submissos para desempenho das mais diversas tarefas, por necessidade ou
conveniência econômica e social, eram obtidos através de guerras contra povos
de origem estrangeira. Assim foi com os egípcios, os gregos e os romanos. Com o
tempo e a evolução cultural, porém, encontramos que, principalmente a partir da
Grécia, as noções de ética começam a exigir, do ser humano, justificativas para
seus atos perante a sociedade. Nesse momento, para justificar a continuidade da
política de submissão, o racismo, que já existia como focos esparsos de
“estranhamento” e incompreensão frente às diferenças, ganha força como
instrumento político. Em Esparta, para citar um exemplo, os escravos eram
propriedade do Estado. O grande dilema: com que justificativa escravizar outro
ser humano, partindo do pressuposto de que ele é igual a você? Onde reside seu
direito? O racismo resolve isso com facilidade, e seu postulado básico é: “NÓS
somos diferentes, e EU sou superior a VOCÊ e, portanto, VOCÊ tem de se submeter
a MIM”. De todas as formas como a discriminação se manifesta, como a cultural,
a religiosa ou a sexual, algumas controversas e sutis, a diferença da cor da
pele é a mais evidente, a mais inquestionável.
Enquanto que, na colonização do Oriente, a
diferença racial do conquistador branco esbarrou na dificuldade surpreendente
de uma cultura já sólida e enraizada (leia-se, capaz de se defender), tal
aconteceu de forma mais tênue na conquista da raça vermelha na América Central,
e menos ainda na escravização da raça negra, na África. Mesmo assim, as
dificuldades naturais para a submissão do índio acabou resvalando para o
genocídio, enquanto a docilidade do negro o tornou o “escravo ideal”, nas Américas
de Norte a Sul.
A noção cultural da superioridade da raça
branca se espalha sem restrições significativas, como seria de se esperar, no
berço cultural predominante no mundo, o europeu. Tal fato se reflete na
literatura, para que não percamos de todo o foco, como se pode constatar
facilmente lendo grande parte dos principais autores dos séculos XVIII e XIX.
Neste último, a explosão da ciência como fator de progresso da sociedade dá margem,
apesar de tantas benesses, ao surgimento de “dogmas científicos”, entre eles o
de que a “raça ariana” seria naturalmente superior à “mongoloide” e à
“negroide”. Em 1883, Francis Galton
cunha o termo “eugenia”, ou "o
estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as
qualidades raciais das futuras gerações, seja física ou mentalmente".
Voltando
à literatura, citemos, como exemplo, o tão cultuado e respeitado Jules Verne.
Na obra “Cinco Semanas num Balão”, por exemplo, há um trecho onde os
personagens comentam que é melhor negociar com os árabes do que com os negros,
porque são “menos selvagens”. Em outro, num episódio onde o balão dos
aventureiros se vê cercado por estranhos “agressores” no coração da África,
segue-se o diálogo:
“- Nós julgávamos
que te haviam cercado os indígenas.
- Felizmente não
passavam de macacos – respondeu o doutor.
- A diferença de
longe não é grande, caro Samuel.
- Nem mesmo de
perto – replicou Joe.”
Diante do exposto até aqui, fica fácil compreender por que esse tipo de
ocorrência, na literatura, não causava nenhum tipo de comoção ou
constrangimento significativo. Simplesmente não existia razão histórica para
tal questionamento!
Ainda no século XIX, mas agora nos Estados Unidos da América, o racismo
como instrumento de submissão ganha contornos mais definidos (e trágicos)
através do que passou à História com o nome de “Destino Manifesto”. A expressão
foi cunhada pelo jornalista John O’Sullivan, para sua revista Democratic Review, nos seguintes termos:
"Nosso destino manifesto, atribuído pela Providência Divina, para
cobrir o continente para o livre desenvolvimento de nossa raça, que se
multiplica aos milhões anualmente."
Tornou-se política oficial. Em 1857, o
presidente James Buchanan afirmou, em seu discurso de posse:
"A expansão dos Estados Unidos sobre o continente americano, desde
o Ártico até a América do Sul, é o destino de nossa raça (...) e nada pode
detê-la".
De política de Estado, o Destino Manifesto
tornou-se ideologia, que se realimentou gerando uma ideia fixa da pré-destinação dos norte-americanos
da época sobre os outros povos americanos descendentes de indígenas,
hispânicos, e escravos negros. Na conquista do Oeste, levou ao genocídio dos
povos indígenas. É sugestiva a afirmação, sobre esse mister, de Benjamim
Franklin:
"Se faz parte dos
desígnios da Providência extirpar esses selvagens para abrir espaço aos
cultivadores da terra, parece-me oportuno que o rum seja o instrumento apropriado.
Ele já aniquilou todas as tribos que antes habitavam a costa."
Observem no “pano de fundo”, sempre, o
propósito da dominação. Sobre esse triste período histórico, sugiro a leitura
do livro “Enterrem Meu Coração na Curva do Rio”, de Dee Brown, um dos poucos
livros que já me fizeram chorar (literalmente). Não é difícil enxergar como
essa ideologia dita as bases da política internacional estadunidense até os
dias de hoje.
É nesse pé que nossa viagem histórica chega ao século XX, e ao Brasil. Imagine
o entusiasmo com que setores da intelectualidade brasileira abraçaram a
eugenia, tão “badalada” em países como Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha e
França. Para as elites da América Latina, a eugenia era um símbolo de modernidade,
uma ferramenta científica capaz de colocar nossos países no trilho do progresso.
As primeiras publicações sobre eugenia no Brasil apareceram por aqui em meados
dos anos 1910, a partir de artigos publicados na imprensa do centro do país e
em teses acadêmicas, especialmente em Faculdades de Medicina do Rio de Janeiro,
São Paulo e Bahia. Entre os temas mais tratados pelos eugenistas brasileiros
estavam a educação higiênica e sanitária, a seleção de imigrantes, a educação sexual, o controle
matrimonial e da reprodução humana, incluindo polêmicas sobre esterilização eugênica,
e debates em torno da miscigenação, branqueamento e a regeneração racial,
questões que se estenderam até além da década de 30. Um meio de cultura ideal,
como facilmente se perceberá, para o crescimento do fungo do racismo, neste
país que se destacou pela colonização com a participação marcante da escravidão
negra.
É compreensível que nossa literatura refletisse, entre outros tantos
movimentos de pensamentos, também a corrente eugênica. Na Argentina, é
interessante citar a obra de Leopoldo Lugones (1874 - 1938), autor que recheava
seus contos de ideias extraídas de publicações acadêmicas dos mais diversos
campos da ciência. Em seu conto “Yzur”
(1906), onde o narrador descreve seus esforços no sentido de fazer um chimpanzé
falar, entre as razões que defende para o sucesso da experiência, em dado
momento ele afirma: “meu espécime era jovem, e todos sabem que a juventude é a
fase mais intelectual do macaco, assim como acontece no negro.”
E chegamos enfim ao escritor brasileiro, contemporâneo de Lugones e da
“febre eugênica” no nosso país, Monteiro Lobato (1882 – 1948). Diante de todo o
exposto, penso que agora estejamos em condições de apreciar alguns argumentos,
que se destacaram na fervente discussão mencionada no longínquo iníco deste
artigo.
“Monteiro Lobato era racista.”
Sim, ele era. Não só deixa isso claro em vários textos, inclusive
correspondências pessoais, como era eugenista (e já vimos como os dois
engendros psicológicos andam de mãos dadas), bastante influenciado pela obra do psicólogo e físico amador francês Gustave Le Bon, cujos
livros L’Homme et les Sociètes, Evolução da Força e Evolução
da Matéria, defendendo ideias de
superioridade racial, degeneração e eugenia, Lobato conhecia de
longa data. Era, pois, ao contrário do que defendem alguns desinformados na
famigerada discussão, um homem do seu
tempo, representante típico não apenas de uma fatia da sociedade brasileira
da época, mas de sua elite. Um homem que pensava como grande número de seus
contemporâneos, embora apenas seu nome (e o de uns poucos outros) tenha se
destacado para a posteridade, pelo simples fato dele ter deixado como legado,
diferentemente da maioria, uma obra literária, onde naturalmente se refletem
suas ideias. Longe de mim, com essas afirmações, justificar Lobato, mas simplesmente explicar, e essa contextualização nos será importante mais adiante.
O livro “O Presidente Negro”, semente da celeuma, também chamado “O
Choque das Raças”, foi escrito nos moldes das obras de crítica social do
britânico H. G. Wells. Produzido em 1926 (e repare como, neste artigo, datas
são relevantes), tendo como finalidade o mercado americano, país para onde
Lobato se transferiria como adido comercial no consulado brasileiro em New
York. Numa carta ao amigo Godofredo Rangel, assim Lobato descreve seu novo
livro:
“Um romance americano, isto é, editável nos Estados
Unidos(...). Meio à Wells, com visão do futuro. O clou será o choque da raça negra com a branca,
quando a primeira, cujo índice de proliferação é maior, alcançar a raça branca
e batê-la nas urnas, elegendo um presidente negro! Acontecem coisas tremendas,
mas vence por fim a inteligência do branco".
Não se trata, pois, de livro para crianças, como sua obra mais
conhecida, “O Sítio do Pica-pau Amarelo”, publicado entre os anos de 1920 e
1947 (datas, datas...). Não fosse “O Presidente Negro”, possivelmente Lobato
não se tornasse, no século XXI, vítima de um verdadeiro patrulhamento
ideológico, dando aqui uma conotação literal á expressão, um pouco distinta da
acepção original cunhada especificamente para a ação política esquerdista nos
anos 70. “Patrulhamento ideológico” seria, no caso, uma ação coordenada de
grupos específicos no sentido de denunciar, desmoralizar e abafar correntes de
pensamento distintas daquelas defendidas ou valorizadas por esses mesmos
grupos.
Mas eis que Nilma Gomes, nova ministra do governo de Dilma Rousseff para a
pasta de ‘Políticas de Promoção da Igualdade Racial’, pediu que o livro
‘Caçadas de Pedrinho’, do escritor Monteiro Lobato (publicado em 1933), seja
banido do Programa Nacional Biblioteca na Escola, por entender que a obra
contém conteúdo racista. A justificativa seria a forma estereotipada como é
apresentada a personagem Tia Nastácia, e a maneira desrespeitosa (e racista)
com que Emília se refere a ela. Recentemente, a mesma obra sofreu acusações do
Instituto de Advocacia Racial, que entrou com um mandato de segurança junto ao
Supremo Tribunal Federal pedindo a retirada do livro da lista de leitura obrigatória
em escolas públicas. O caso foi indeferido pelo Ministro Luiz Fux.
A intenção explícita
de limitar o contato do leitor com a obra consiste, sim, em patrulhamento
ideológico. Mais argumentos curiosos:
“Uma vez
que há tantos outros autores bons tratando de temas relacionados ao racismo,
por que Monteiro Lobato?”
Seria o caso de
inverter a questão: se resultados tão bons têm sido obtidos com o Sítio do
Pica-pau Amarelo na formação de leitores, junto às crianças, por que não (entre
os demais) Monteiro Lobato?
“Ah,
porque crianças negras se sentem mal ao tomarem contato com as falas da Emília.
Crianças podem receber a semente do racismo ao tomarem contato com esse
exemplo.”
Não seria isso uma
falha na maneira com que o educador encara essa questão e conduz o processo de
leitura? Não poderia ser diferente?
“O sistema
educacional brasileiro é deficiente. Os professores não estão preparados para
tratar dessa questão adequadamente. Isso seria uma utopia.”
Falácia. Eu estudei
numa escola, há quase 40 anos, onde a criança é ensinada a aprender PENSANDO.
Meus filhos estudam nessa escola hoje. O fato de isso ser real descaracteriza a
“utopia”.
“Mas seu
caso é uma minoria! No geral é diferente.”
De fato. Mas essa
realidade transforma a ”utopia” num problema real, mas que pode ser resolvido.
Com mais dificuldade, com muito trabalho, mas possível. É curioso que esses
pessimistas não defendam que a sociedade livre do racismo seja uma “utopia”, o
que torna o argumento uma solução para quando não existe nenhum argumento
melhor. Um programa público de preparo dos docentes especificamente para tratar
dessa questão; uma leitura orientada de “Caçadas de Pedrinho”, fazendo
perguntas que levem o leitor a raciocinar, apontando particularidades e
dirigindo o debate com tato para o tema desejado; um trabalho, como dever de
casa, sobre “racismo”, com discussão posterior. Isso é tão irreal assim?
Não subestime a
criança: ela não é burra. É preciso lembrar que a criança em idade escolar está
começando a usar sua razão. Começa a distinguir (e rotular) o certo e o errado,
o bem e o mal. E começa a ter de posicionar suas opções de acordo com essas
compreensões. A idade escolar é, pois, a idade mais propícia à formação de
conceitos. Não seria uma excelente oportunidade contar com uma obra acessível e
palatável para sua faixa etária, como “O Sítio do Pica-pau Amarelo”, para
ajudar na docência, na formação de conceitos saudáveis sobre as diferenças
raciais? Depois, numa idade maior, aproveitando o testemunho vivo da
mentalidade de uma época histórica proporcionado por Lobato, promover uma
contextualização da obra, mostrando que a humanidade evoluiu, mas que cabe às
novas gerações melhorar ainda mais, não repetindo o que não é mais aceitável e
superando a própria conduta quanto ao tema? Por que o ser humano insiste na
solução menos trabalhosa, porém menos eficaz: varrer a História para baixo do
tapete, pasteurizar, maquiar a visão do passado, mutilar os fatos e apagar conquistas,
tirando aos novos a oportunidade de APRENDER com os erros e acertos do passado?
Sim, é mais trabalhoso. Mais fácil é se entregar ao coitadismo, e partir para o
revide! Lanço minha pergunta aos ativistas da causa racial: com essa
alimentação contínua do círculo vicioso dos ódios e da acentuação das
diferenças, como esperam que a questão do racismo se resolva definitivamente?
Seria meramente razoável imaginar que é possível a vitória de uma das partes,
seja ela qual for, numa guerra cuja verdadeira motivação, a submissão do outro,
permanece oculta? Aquele que sente ou sentiu na carne a discriminação racial,
antes de se opor a um trabalho consciente de unificação, deveria consultar
intimamente o próprio coração e responder à pergunta: no que se refere ao
racismo, o que EU quero DE VERDADE? O doce, embriagante sabor da vingança, ou que
a geração de meus filhos e netos não sofra mais o que sofri? Está aí a
diferença entre promover esforços conscientes de coexistência interracial sadia
OU fomentar a luta de classes (rico X pobre, médico X paciente, esquerda X
direita, patrão X empregado, branco X negro), instrumento tão do agrado da
ideologia política que ocupa momentaneamente o poder neste país, cuja ministra
pretende simplesmente abortar a oportunidade do aprendizado sobre tema tão
fundamental. Qualquer tentativa de solucionar uma questão tão terrível e tão universal há de fracassar enquanto os envolvidos se deixarem seduzir e reduzirem o debate ao foro pessoal relativo ao problema, por mais dolorosa que seja essa questão.
Cabe analisar mais um
argumento estapafúrdio que meus olhos doloridos são obrigados a ler nas
discussões:
“Um branco
não tem como opinar com suficiência sobre esse assunto, porque não sentiu na
carne o que o negro sofre.”
Repare que é um
argumento, além de tudo, racista: a incapacidade de uma pessoa de deliberar
sobre uma questão determinada, por causa da sua cor de pele. Antes que voltem,
entre dentes rangentes, a me acusar de “utopista”, permitam-me lembrar mais um
caso prático da vida real. Lembro-me de certo Nelson Mandela, ex-mártir do apartheid; chegando á presidência de seu
país, em vez de inverter o vetor do ódio (como seria de se esperar), optou por
encontrar formas de coexistência mútua,
inteligente, harmônica, usando inclusive, para isso, o esporte (que tal
usar a literatura?). Você pode ver essa história no filma “Invictus”, por
exemplo, estrelado por Morgan Freeman, mas não convide um ativista do coitadismo
racial para o programa. Eles, curiosamente, evitam introduzir Mandela nas
discussões. Chego a pensar se alguns ainda o consideram negro...
Tenho a honra de ser
autor e um dos organizadores da coleção de livros infantis “Nossa Turma”. No
volume 2 da coleção, intitulado “Somos Todos Irmãos” (http://www.infancia.com.br/somos), que trata justamente das
diferenças raciais, o autor Guilherme Cavalieri escreve:
“- As diferenças são culturais, mas as semelhanças são
universais. Nós somos muito semelhantes a todas as pessoas de nosso planeta.
Quer ver? Vou dar a você algo que um chinesinho também gosta de receber do pai
dele.
- O que é, hein, papai? – Heitor indagou, vivamente interessado.
Com um jeito muito carinhoso, seu Jéferson abriu os braços,
aproximou-se do filho e lhe deu um abraço. Heitor compreendeu muito bem e
disse:
- Já sei o que é! O amor do pai pelo filho faz parte da vida de
todas as pessoas do mundo, mesmo se ela for da China ou de um lugar muito
diferente!”
Eis uma forma de
ajudar a criar uma humanidade melhor, acentuando as semelhanças em vez de
agudizar as diferenças. Aliar a isso a compreensão de quanto mal já se fez em
nome das diferenças, em vez de pretender apagar essa realidade da História,
pode proporcionar uma estratégia efetiva no combate definitivo ao racismo. Um
detalhe a mais, que pode ser relevante para alguém: Guilherme, o autor do livro
infantil mencionado, é branco.
Ainda sobre a questão
de Lobato, a escritora Lya Luft revela ter sofrido na carne o racismo (!!!) na infância,
cercada por outras crianças que cantavam: “alemão batata come queijo com
barata”. Doeu, ela diz. No final de seu artigo, sobre a possibilidade da
proibição de Lobato nas escolas, ela exorta:
“O politicamente correto pode ser perigoso e
hipócrita. Os meus olhos azuis, como os de um de meus filhos, e os olhos
escuros dos outros dois, como os oblíquos dos japoneses e os olhos pretos dos
árabes, são todos da família humana, muito maior e mais importante do que suas
divisões raciais.
Nem comecem a dar ouvidos a essas buscas mesquinhas
por culpados a ser jogados na fogueira: livros queimados foram um dos índices
sinistros — ao qual nem todos deram a devida importância — da loucura nazista.
Muita tragédia começa parecendo natural e desimportante: no início, achava-se
Hitler um palhaço frustrado. Deu no que deu, e manchará a humanidade pelos
tempos sem fim.
Que não comece entre nós, banindo um livro infantil
de Monteiro Lobato, o mais brasileiro dos nossos escritores: será uma onda do
mal, uma nova caça às bruxas, marca de vergonha para nós. Não combina conosco.
Não combina com um dos lugares nesta conflitada e complicada Terra onde as
etnias e culturas ainda convivem melhor, apesar dos problemas — devidos em
geral à desinformação e à imaturidade: o Brasil.”
Amém, Lya Luft.
Enfim,
como sobremesa, o link para o quadro que um programa da MTV fez acerca dessa
questão. Enjoy: https://www.youtube.com/watch?v=Z6FN_yrQV04
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